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Notícias e Julgamentos - 14/02/22

Hugo Funaro comenta, no Conjur, ADI sob relatoria de Alexandre que define se Difal pode ser cobrado em 2022

Veículo: ConJur
Autor(es): Dr. Hugo funaro

A polêmica sobre a cobrança do diferencial de alíquota (Difal) do ICMS em 2022 já foi levada ao Supremo Tribunal Federal por meio de duas ações diretas de constitucionalidade, que estão sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes. No julgamento do último ano que definiu a necessidade de lei complementar para a cobrança do imposto, Alexandre ficou vencido, com o entendimento de que não se tratava de um novo tributo. Com isso, os contribuintes monitoram se a análise das novas ADIs pode prejudicá-los.

Apesar da possibilidade de uma tese desfavorável ao contribuinte, que permitiria a cobrança do Difal já em 2022, o advogado Leo Lopes, sócio do escritório FAS Advogados, diz que a relatoria das ADIs “não é motivo de preocupação, mas sim de atenção”.

Cenário atual

Nas instâncias inferiores, a maioria das decisões liminares proferidas vêm afastando a cobrança do tributo neste ano. O fundamento é sempre o princípio da anterioridade anual, segundo o qual
leis que criam ou aumentam um imposto só produzem efeitos no ano seguinte à sua publicação. No caso do Difal, a lei complementar federal foi sancionada no início de janeiro.

Já há liminares contra a cobrança do Difal em 2022 na Justiça do Distrito Federal, do Espírito Santo e de São Paulo, por exemplo. Neste último, houve até mesmo liminar confirmada pelo Tribunal de Justiça, mas ainda há decisões conflitantes sobre o tema.

Placar no Supremo

A advogada Wilmara Lourenço, sócia coordenadora do núcleo do terceiro setor do escritório Nelson Wilians Advogados, explica que, em 2021, Alexandre de Moraes “aduziu que o Difal não se trata de imposto propriamente dito, mas tão somente de uma sistemática de distribuição e adequação do ICMS em operações interestaduais”. Assim, não seria necessária uma lei complementar, “posto que o Difal já era cobrado anteriormente ao advento da Emenda Constitucional 87/2015 nas situações em que o consumidor final é contribuinte do imposto”.

Naquele julgamento, Alexandre formou a divergência derrotada, junto aos colegas Nunes Marques, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux e Gilmar Mendes. Mas Gustavo Vaz Faviero, coordenador do departamento tributário do Diamantino Advogados Associados, lembra que o contribuinte pode ter um voto favorável a menos, devido à aposentadoria de Marco Aurélio. Assim, a nova definição passa a depender do voto do novo ministro, André Mendonça.

“Neste novo cenário, a maioria dos ministros do STF poderia entender que não houve a instituição de novo imposto, mas sim a alteração da forma de cobrança do ICMS, e, com isso, não haveria necessidade de se aguardar até 2023 para a cobrança do Difal”, sugere Faviero.

No entanto, o tributarista Hugo Funaro, sócio do Dias de Souza Advogados, considera que o posicionamento dos ministros no julgamento sobre a necessidade de lei complementar para instituição do Difal “não deverá interferir negativamente na apreciação do tema da anterioridade”. Isso porque o Plenário já firmou sua orientação sobre o assunto, e assim o julgamento das novas ADIs “deve guardar coerência” com as decisões anteriores, “por razões de segurança jurídica e coesão do sistema”.

Em outras palavras, já que o STF como um todo se posicionou de forma contrária à tese de que não haveria criação ou aumento de tributo, isso deve ser observado por todos os ministros em
julgamentos futuros relacionados.

Na visão de Ana Carolina Utimati, sócia da área tributária do escritório Lefosse, os votos desfavoráveis à tese dos contribuintes no julgamento do último ano não deveriam impactar as novas ADIs, pois o tema é completamente diverso. “Os ministros contrários à tese da ADI 5.469 não precisam alterar seu entendimento anterior para eventualmente proferirem decisões favoráveis aos
contribuintes no tocante à anterioridade”, aponta.

Já para Adriano Milanesi Sutto, tributarista do Veirano Advogados, “não é possível afirmar categoricamente” que o entendimento no julgamento anterior levaria a outro semelhante. Ele lembra que os debates serão reabertos: “O máximo que eu apontaria é uma possível tendência de entendimento do tribunal nesse sentido de que não houve aumento ou criação de tributo, seguindo o que foi entendido na outra discussão sobre a lei complementar”. Segundo o advogado, trata-se de um indício, não de uma certeza.

Por sua vez, Leo Lopes lembra que o relator pode inicialmente adotar um posicionamento contrário ao contribuinte, mas a decisão seria temporária. “Essas ADIs terão que ser apreciadas pelo Plenário, momento em que a expectativa é de que se reconheça a inconstitucionalidade da cobrança do Difal para 2022”. Para ele, seria “uma questão de coerência com a jurisprudência do próprio STF”.

Otimismo

“No fundo, se está a discutir se o Difal representa majoração do ICMS ou mera regra de repartição de receitas tributárias (questão de direito financeiro, portanto)”, diz Arthur Barreto, advogado tributarista do escritório Donelli e Abreu Sodré Advogados. Ele confia que o STF confirmará a vigência do tributo apenas em 2023, “sob pena de impor aos contribuintes o ônus da desorganização e ineficiência dos estados”.

Hugo Funaro recorda de precedente da corte que pode ser usado de forma favorável ao contribuinte: um recurso extraordinário, julgado em 2020, no qual se decidiu que o ICMS na importação de bens e mercadorias pode ser cobrado com base em leis estaduais editadas após a Emenda Constitucional 33/2001 e antes da entrada em vigor da Lei Complementar 114/2002, que regulou a exigência. No entanto, os efeitos de tais leis estaduais foram limitados a partir da vigência da lei complementar federal.

O próprio Alexandre de Moraes proferiu o voto vencedor daquele julgamento. Ele mencionou o entendimento firmado em outro caso, no qual foi afirmada expressamente a necessidade de se observar o princípio da anterioridade nonagesimal. Na ocasião, a anterioridade anual já estava contemplada.

“De todo modo, o que resulta claro do precedente é que o princípio da anterioridade deve ser contado a partir da edição da lei complementar porque, somente com a publicação desta, foi injetada eficácia jurídica nas leis ordinárias preexistentes”, ressalta Funaro. Para ele, as razões jurídicas acolhidas pelo STF neste e no próprio caso do Difal indicam “uma tendência de confirmação da
jurisprudência que vem se formando nos tribunais no sentido de que a contagem dos prazos de anterioridade constitucionais deve ser feita a partir da data de publicação da lei complementar”.

Wilmara Lourenço também lembra que Moraes votou pela aplicação da anterioridade anual em outro caso análogo (ADI 5.733), relativo a um adicional de 2% sobre o ICMS incidente na primeira operação de saída de insumos para produção de refrigerantes no Amazonas, instituído por meio de lei estadual.

João Paulo Cavinatto, também sócio tributário do Lefosse, explica que o entendimento do STF é “no sentido de que o ICMS apenas é considerado exigível quando existem, concomitantemente, lei complementar e a respectiva legislação local”. Na falta de algum desses elementos, “o tributo ainda não estaria constitucionalmente instituído e consequentemente não haveria que se falar em análise da anterioridade nonagesimal ou anual”.

Assim, os prazos seriam contados a partir da lei complementar, caso os estados já tenham legislação sobre o tema; ou a partir da lei estadual, caso a lei complementar federal já tenha sido sancionada. No caso do Difal, muitos estados já haviam editado normas internas, como forma de antecipação à publicação da lei complementar.

Para Wilmara, deve prevalecer a tese estabelecida no último ano pelo STF. “Contrariar o decisum no caso apreciado seria firmar novo entendimento de fato com o mérito apreciado, o que, destarte, não faz o menor sentido”.

Para Igor Mauler Santiago, doutor em Direito Tributário, sócio fundador do Mauler Advogados e colunista da ConJur, “dificilmente o Supremo alterará a recente decisão que reconheceu a necessidade da lei complementar. A colegialidade há de prevalecer”. A discussão deve focar em quais anterioridades teriam efeito. Isso porque a nova lei complementar menciona expressamente a anterioridade nonagesimal, mas não a anterioridade anual. Apesar disso, o artigo da Constituição que prevê a noventena, por sua vez, já faz menção à anterioridade anual.

Indefinição

Adriano Sutto destaca que a definição do STF sobre o tema “vai diminuir todo um contencioso potencial pulverizado por todos os estados”. Segundo ele, apesar de muitas decisões favoráveis nas primeiras instâncias, há ainda muitas decisões pouco técnicas, que não se manifestam claramente sobre qual é a anterioridade aplicável.

Assim, apesar da possibilidade de um resultado desfavorável ao contribuinte, o tributarista entende que a decisão vai garantir maior segurança jurídica, devido aos seus efeitos gerais e vinculantes a todos.

Ana Utimati reforça tal apontamento: “Até o julgamento dessas ADIs, continua havendo grande insegurança jurídica para os contribuintes, considerando a decisão da ADI 5.469 e todas as legislações estaduais regendo a cobrança do Difal”.

Possível derrota do contribuinte

De acordo com Sutto, apesar de não haver certeza, precedentes antigos da corte podem indicar uma tendência de não se aplicar qualquer anterioridade, sob o argumento de que a lei complementar não gerou nenhum aumento de tributo.

Hugo Schneider Côgo, sócio coordenador da área tributária do SGMP Advogados, destaca que “o próprio STF tem se mostrado notoriamente inclinado ao argumento fazendário de que o erário deve ser protegido contra a perda de receitas tributárias”. Isso ficou demonstrado, por exemplo, na modulação dos efeitos do julgamento que proibiu a cobrança de alíquotas maiores de ICMS sobre serviços de energia e telecomunicações.

Para Côgo, “a rigor, não deveria haver motivo para preocupação”. Porém, “em que pese haja sólidos fundamentos para se sustentar a cobrança do Difal apenas a partir do ano de 2023, os contribuintes devem ser cautelosos na definição da sua estratégia”.

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